Fechado há 12 anos, o Teatro Municipal Sandoval Wanderley (TSW), localizado no bairro do Alecrim, está em processo de requalificação para voltar a receber público. Ainda não há previsão para que as portas da casa sejam abertas novamente, mas a estimativa da Secretária de Cultura de Natal e Fundação Cultural Capitania das Artes (Secult/Funcarte) é de que o processo licitatório para início das obras de reconstrução seja lançado em novembro. O prédio do antigo "Teatrinho do Povo", como era conhecido, segue fechado, isolado com tapumes na escadaria de acesso.
Atualmente estão sendo executados projetos complementares para recuperação da estrutura nas partes elétrica, climática, cenográfica, luminotécnica, hidrossanitária, telefonia, drenagem e combate a incêndio, além da implantação do Sistema de Proteção contra Descargas Atmosféricas (SPDA). A estimativa da Funcarte é de que esta fase seja finalizada em 30 dias. Cerca de R$ 33 mil, com recursos oriundos do Município foram investidos nesse processo inicial.
A intervenção é feita por equipes técnicas das secretarias de Mobilidade Urbana (STTU) e Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb). As pastas integram um comitê aberto especificamente para planejar a reforma do teatro, que também conta com representantes da Funcarte e secretarias de Planejamento e Obras Públicas e Infraestrutura. Após a conclusão dos projetos complementares, os relatórios serão encaminhados para vistoria do Corpo de Bombeiros. Uma vez aprovado, o projeto segue para a Comissão Permanente de Licitação da Secretaria de Obras Públicas e Infraestrutura (Semov).
O planejamento contempla novo espaço cênico com cerca de 120 lugares, novos camarins, área de conveniência, piso tipo tablado de madeira, banheiros, hall e foyer totalmente reformulados. O novo Sandoval Wanderley terá entradas acessíveis, depósito, sala para vigias, novo mezanino e compartimento para acomodar o sistema de condensadores de ar. Tudo distribuído em três espaços: térreo, primeiro e segundo pavimentos. “Vai ser um novo teatro, vamos seguir o anteprojeto de Débora em uma ação integrada com a engenharia da STTU e a arquitetura da Semurb. Será uma revitalização total, inclusive terá solar, o teto vai se abrir, terão modernidades arquitetônicas desse patamar”, explica o titular da Funcarte, Dácio Galvão.
Toda a reformulação parte do anteprojeto da arquiteta e urbanista Débora Mendes, que elaborou o plano durante seu trabalho de conclusão de curso, no fim de 2018. Ela cedeu voluntariamente os direitos à Prefeitura de Natal, que fez algumas adequações para tirar o projeto do papel. “Eu sempre me sensibilizei com essa questão e eu decidi colocar isso em prática. Apesar do trabalho ser um exercício, e não necessariamente precisar ser executado, eu sonhava com isso. A ideia é realmente devolver esse equipamento para a sociedade, que era palco de uma classe que não está em nenhum outro lugar da cidade, por ser um teatro popular”, comenta Mendes.
O custo total da reforma e previsão para reabertura, só serão estimados a partir do lançamento do edital de licitação para contratação da empresa responsável. A casa de cultura vai ganhar um novo espaço, que servirá como área de escape. Uma parceria entre a Prefeitura de Natal e o Governo do Estado viabilizou o novo ambiente, já que a área pertencia a Escola Estadual Professor João Tibúrcio, que fica por trás do teatro.
"Conseguimos a área para que seja feita a reurbanização ali da frente, aquelas cigarreiras serão removidas e a cidade vai ganhar um novo equipamento. Já temos a empresa contratada para executar esses projetos complementares. A gente estima que eles finalizem em 30 dias e aí finalizando esse material, nós já teremos condições de licitar para realização efetiva da obra. Temos dialogado também com a secretaria de Planejamento para elaborar um plano de gestão porque existe uma deficiência muito grande no setor cultural em termos de recursos humanos", ressalta Dácio Galvão.
Dois dos fatores que contribuíram para o fechamento definitivo do teatro ganharam prioridade no novo projeto: o estacionamento e uma saída de emergência. "Essas são deficiências que estão contempladas nesse projeto que submeti. Tentei fazer ao máximo uma proposta que pudesse ser executado na prática. A gente sabe que TFG [Trabalho de Final de Graduação] é muito difícil de sair do papel, mas fico feliz que esteja sendo colocado em prática", afirma Débora Mendes. A arquiteta sugeriu que fosse implementado um estacionamento compartilhado com a agência bancária vizinha ao teatro.
"Quando fui apresentar, até estranharam porque é um tanto complicado lidar com um parte privada e outra institucional, mas apresentei. Era uma proposta complexa, mas Dácio encaminhou para a secretaria e parece que está andando", complementa Mendes. De acordo com Dácio Galvão, o Executivo recebeu o sinal verde para firmar uma parceria com a Fundação Bradesco para viabilizar a ideia do estacionamento compartilhado.
Sandoval Wanderley é conhecido como Teatrinho
O Teatro Sandoval Wanderley foi construído em 1962 e é o segundo mais antigo de Natal, atrás apenas do Teatro Aberto Maranhão (1904). Da sua fundação até o início da década de 1970 era conhecido como o “Teatrinho do Povo” devido ao apelo popular, que o tornava o centro cultural do Alecrim. Na ditadura militar, o teatrinho foi fechado pela primeira vez. “Os militares fecharam o teatro porque diziam que era coisa de comunista, aquelas coisas, e colocaram lá uma escola infantil, um jardim de infância para justificar o fechamento”, lembra Racine Santos, escritor, dramaturgo e amigo de Sandoval Wanderley. “Na época fui até o Rio de Janeiro, onde funcionava o Serviço Nacional do Teatro e conseguimos uma verba para reabrir o teatro e aí colocaram a escola em outro canto. Isso em 1969”, acrescenta.
O espaço ganhou o nome de Sandoval Wanderley no ano de 1973 em homenagem ao ex-vereador, escritor e dramaturgo potiguar, que havia falecido no ano anterior. Sandoval Wanderley nasceu em Assu, no Oeste potiguar, em 1893 e foi um dos diretores do grupo Ginásio Dramático e fundador do Conjunto Teatral Potiguar (1941) e do Teatro de Amadores de Natal (1951). Ele também é autor de dezenas de peças, entre elas “E ofende?”, “Um dos Três é o Pai”, “Taberna Azul” e “Por causa de uma Mini-saia”.
Entre altas e baixas temporadas, o Teatro Sandoval Wanderley permaneceu ativo até maio de 1986, quando uma parte da construção ruiu. Por motivos de segurança, a estrutura foi inteiramente demolida e um projeto de reconstrução foi desenvolvido para que o centro cultural do Alecrim fosse reerguido em 1992, desta vez reformulado, em formato de caixa retangular.
Na última fase do Sandoval Wanderley, grandes nomes passaram pelo palco do teatrinho, como Tetê Espíndola, Miúcha, Fausto Nilo e Zé Celso Martinez. As portas do teatro foram fechadas em 2009 e seguem assim desde então.
"É um descaso, uma violência, que este teatro esteja fechado há tanto tempo. E do jeito que está, cheio de barracas, camelôs, na frente, e a prefeitura permitiu que isso acontecesse. Hoje Natal só tem o palco do teatro do Midway Mall que é particular, temos o Teatro Alberto Maranhão e o Sandoval Wanderley fechados. Enquanto dramaturgo, que trabalhou com Sandoval Wanderley, eu só tenho a lamentar. É muito triste o que fizeram com a nossa cultura. O desejo é de que os projetos possam sair do papel e que a gente tenha teatros públicos abertos na cidade", comenta Racine Santos.
TRIBUNA DO NORTE