Governo mantém sigilo de pesquisas encomendadas sob Lula e vai liberar as de Bolsonaro

 

Gabriela Biló – 25.out.24/Folhapress

O governo Lula (PT) decidiu manter sob sigilo as pesquisas de opinião que foram encomendadas pela Secom (Secretaria de Comunicação Social) a partir de 2023, na gestão do petista, mas vai liberar o resultado de levantamentos feitos na gestão de Jair Bolsonaro (PL).

Em parecer apresentado em novembro passado, a CGU (Controladoria-Geral da União) aceitou os argumentos da pasta, comandada pelo então ministro Paulo Pimenta (PT), de que as pesquisas do atual mandato são “documentos preparatórios” e não podem ser divulgadas.

A Secom ainda argumentou que a publicação antecipada pode “resultar em pressões externas ou na manipulação da opinião pública” e prejudicar propostas de governo em andamento.

A CGU afirmou que os dados podem ser divulgados no fim do mandato de Lula ou quando for “implantada” a política pública ligada a cada pesquisa.

A Controladoria, por outro lado, decidiu que os levantamentos da gestão Bolsonaro, todos feitos em 2022, devem ganhar publicidade. Nesse caso, o posicionamento representa uma mudança de atitude da CGU. Em junho, a pasta havia concordado em manter sob sigilo todas as pesquisas, inclusive aquelas realizadas antes de 2023.

A Folha solicitou o material referente aos levantamentos encomendados pelo governo Bolsonaro, com base na LAI (Lei de Acesso à Informação). Em novembro, a Secom afirmou que precisaria de 90 dias para avaliar e tratar o conteúdo das pesquisas.

No total, a Secom pagou R$ 13 milhões por 33 levantamentos realizados, de 2022 a 2024, pelo Ipri (Instituto de Pesquisa em Reputação e Imagem), divisão de pesquisas da empresa FSB. O instituto venceu uma licitação em 2022, e o último trabalho foi realizado em abril de 2024, quando se encerrou o contrato.

A reportagem também solicitou acesso a uma lista específica de pesquisas feitas desde 2022 e pediu para a Secom apontar o motivo do sigilo de cada uma delas.

A pasta, no entanto, apontou apenas que os relatórios de pesquisas “passíveis de divulgação” já estavam disponíveis em seu site, sem informar a razão de cada levantamento permanecer escondido.

O link fornecido pela Secom apresenta os resultados de pesquisas realizadas de 2009 a 2011 e de 2013 a 2018.

A gestão Bolsonaro encomendou 13 das 33 pesquisas feitas pelo Ipri. A Secom sinaliza que esses levantamentos devem ter os resultados divulgados neste primeiro trimestre de 2025.

As pesquisas do governo passado incluem avaliações colhidas em entrevistas feitas em domicílios, antes das eleições de 2022. Os temas das sondagens eram Auxílio Brasil, “conjuntura nacional”, “juventude e universo feminino” e “inclusão e programas sociais”, entre outros.

O governo Bolsonaro ainda encomendou sete levantamentos com o rótulo “regular semanal”, feitos por telefone. O último foi feito em dezembro de 2022, quando o então presidente já havia sido derrotado na disputa ao Planalto.

Já o governo Lula quis saber a opinião da população sobre as marcas de 100 dias e de 1 ano do governo petista. Essas pesquisas custaram R$ 2,1 milhões cada. São os maiores valores pagos por levantamentos individuais dentro do contrato com o instituto.

No total, as pesquisas encomendadas sob Lula custaram R$ 9,8 milhões.

No governo petista, a Secom ainda encomendou levantamentos sobre “diagnóstico de políticas públicas”, “perfil da classe média brasileira”, “endividamento da população brasileira”, “avaliação de governo e conjuntura” e “conflito no Oriente Médio e agenda pública”.

As pesquisas mais recentes também incluem a percepção sobre os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023.

Outra pesquisa trata especificamente da Operação Sequaz, da Polícia Federal, contra uma suposta tentativa do PCC (Primeiro Comando da Capital) de realizar ataques contra autoridades, entre elas o ex-juiz e senador Sergio Moro (União Brasil-PR). Em março de 2023, Lula se tornou alvo de críticas ao afirmar que o plano descrito pela PF era uma “uma armação” do ex-ministro de Bolsonaro.

Procuradas, a CGU e a Secom não se manifestaram sobre a decisão de manter todas as pesquisas feitas sob Lula em sigilo.

Em recursos apresentados nos processos baseados na LAI, a Secom afirmou que o site da pasta já aponta “valor e objeto de cada pesquisa”. O link indicado, porém, aponta um título genérico da pesquisa, sem detalhar quais foram as perguntas feitas à população e seus resultados.

A Secom também considerou o pedido para liberar os documentos “desarrazoado”. A secretaria citou uma portaria do fim de 2023 sobre o acesso a informações da Presidência. O texto barra a divulgação de dados que podem “trazer maiores prejuízos à sociedade do que os benefícios de sua divulgação”.

Ao ser acionada em recurso apresentado pela reportagem, a CGU disse que existe precedente “em que se decidiu pelo indeferimento do recurso, por entender que resultados de determinadas pesquisas possuem o potencial de trazer à tona informações distorcidas referentes a uma política pública a ser implantada”.

Segundo a CGU, a divulgação ainda poderia “frustrar expectativas e gerar a propagação de informações equivocadas, além de que se tratam de documentos preparatórios à tomada de decisão futura, cujo acesso é assegurado a partir da edição do ato ou decisão correspondente”.

Folha de São Paulo